Eu me arrebento pelas janelas. Inconformado com minha imagem
recolho meus pedaços. São as luzes do lado de fora que iluminam meus estilhaços
do lado de dentro. Algumas partes ainda machucam, alguns pedaços ainda não
foram engolidos, ainda não foram digeridos pelo tempo das memórias.
Pela falta de novas histórias.
Quanta contradição existe no amor. Quanta indiferença existe
na paixão.
A primeira pede desculpas mesmo sem precisar, a segunda vive
dando desculpas a toda hora.
É muito sério conduzir os sentimentos, é curva complicada,
fechada e sem sinalização. Sem um sinal de onde começa e sem sinal algum de
onde terminam nossas estradas de ilusão.
É controvérsia demais gostar. Gostar é me esquecer pelo
outro. É me esquecer para lembrar do outro.
É gostar da ausência de si mesmo
desde que se encontre no outro. Vida rasa.
Eu ainda entro pela mesma porta todos os dias, ainda coloco
as chaves no mesmo lugar, ainda troco de roupa em frente ao armário, ainda
escrevo cartas para o meu próprio endereço, ainda falo sozinho, ainda me
encontro sem palavras sempre que me lembro de toda nossa involução. É o café na
cozinha, é a madrugada em frente à televisão.
Somos muito breves na caridade com o outro e paralisados em nossas próprias torturas.
Sempre nos lembramos dos detalhes mais cruéis. O beijo no canto
da boca, o colo sobre o sofá, as mãos no rosto, o olhar fixo desconcertante em
meio as melhores palavras do mundo. Podemos passar pelas piores lembranças dos
melhores momentos da saudade que mesmo assim sempre iremos procurar lembrar.
Sempre iremos procurar onde estamos, sempre iremos nos
questionar quem somos. Sempre buscaremos perceber no que nos tornamos. Sempre
iremos lembrar sem cessar.
Lembranças são a essência dos anseios.
Não importa o que foi, não importa o que houve sempre
seremos lembranças.
Lembranças do outro.
Lembranças em nós.
Lembranças dos outros.
Lembranças de nós mesmos.
É inteligência lembrar.
Lembrar que nas incertezas da vida é que sempre podemos ser
mais felizes, com certeza.
W.O.
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