Vasculhei minhas gavetas e armários procurando uma camisa,
havia acordado atrasado para o trabalho, pulei da cama e quase cai dentro do
guarda-roupa. O atraso me fazia querer segurar pelos ponteiros do relógio,
minha vontade era que o tempo voltasse, pelo menos por alguns minutos, mas era
em vão. Atrasei-me, senti o arrependimento pela demora, adormeci no paraíso da
imaginação e despertei no purgatório da acusação.
Não havia mais tempo para pensar, enquanto eu o fazia, o
tempo cortava a velocidade da luz, era impossível voltar. Enquanto com uma das
mãos colocava a camisa, com a outra segurava pela barra da calça, os dentes
serrados mantinham minha gravata presa, me senti um malabarista de circo, notei
que uma simples atitude transformara minha vida em uma bagunça, uma palhaçada inesperado,
uma comédia sem plateia, um fracasso só meu.
Nunca sonhei perder meu emprego.
No amor também perde se a hora, adormecemos na zona de
conforto arquitetando o inferno do outro e acordamos solitários. Não existe
amor que suporte a indiferença do atraso, em doses constantes, em malabarismos
desconcertantes tentando concertar. O atraso de ser gera a falta de fazer, mata
à atitude e ressuscita o anonimato.
Você pode estar junto com alguém por anos e ainda assim ao
acordar deparar-se com um estranho, não que ainda exista o outro do seu lado, mas
se depara consigo mesmo, a solidão expõe quem somos de verdade.
A solidão nos encara, nos desmascara com os dentes rindo de
nossa ilusão.
No amor não existe maior engano que o de imaginar que já não
precisamos fazer mais nada, que o jogo está ganho, que a pessoa que
conquistamos não precisa mais da atenção do começo, não necessita mais dos
cuidados de médico, da compreensão de ouvinte, da gentileza de alma, da
selvageria de corpo.
No amor a certeza pode ser perigosa.
Conquista é casamento de todos os dias, sem ela morremos no
divórcio da felicidade, abraçados a nossa solidão.
W.O.