Pior que o amor bandido, só a paixão prostituta. Uma ingrata
surpresa nas esquinas da alma.
Ela sempre nos aguarda com a paciência de um monge tibetano,
sempre nos observa com a perícia de um franco - atirador, sempre nos atrai como
o maior de todos os ímãs, sempre nos desarma com o pior dos assaltos, sempre
nos tranca e joga a chave fora como o mais cruel dos carcereiros. O carrasco da
masmorra.
Ela nunca pede licença, pois não é regida por educação ou jurisdição
alguma que não seja a do acaso.
Nunca nos convida, pois não sabe pedir, nunca
nos abraça, pois teme deixar de ser o que é.
Paixão assim não deseja se tornar amor. Prefere continuar se
prostituindo de alma em alma.
Para a paixão prostituta, transformar-se em amor seria o
beijo na boca. Seria inadmissível entre as outras integrantes do seu clã, seria
a deserção completa da neutralidade, seria o abandono da frieza e o flerte com
os próprios sentimentos.
Ela tem uma falsa reputação a zelar. Vive da falsa aparência
e morre com o que realmente sente. Morre com o que é.
Somos induzidos pela carência a encontra-la todas as noites.
Nos deparamos contando nossos planos, dividindo reclames, agradecendo dores e
exalando os próprios horrores.
De nada adiantará. Ela ouvirá tudo o que disser, sem dar uma
palavra, um conselho, um palpite, um chute na boca que seja e irá embora. Se levantará
da cama, vestirá sua pouca roupa e sairá pela mesma porta que entrou.
É engano doloroso tentar converta-la ao amor. Ela é incrédula
de afeto e crente em sua falsa justiça.
Paixão prostituta já pode ter sido amor um dia. Amor que não
vingou por falta de insistência ou de vontade mesmo. Pode ter sido verdade um
dia que preferiu se recolher ao invés de encarar novas mentiras. Pode ter sido
carinho por um dia que sofreu descaso de anos e anos.
Sentimentos não sobrevivem quando são renunciados.
É difícil entende-la, mas fácil demais percebe-la.
A paixão que se prostitui na alma não é nada além de nossas
vontades, misturada a nossos medos e anseios. Ela pode ter sua origem na
procura louca e desenfreada por amor, na busca pelo conselho dos amigos que
acham que sabem sempre o que é melhor para nós, na paranoia de nunca saber
viver sozinho.
Um dos lados da cama vazio pode ser sinal de abandono, mas também pode
ser sinal de alívio.
O amor ainda que bandido serve para nos roubar para o outro,
serve para tirar de nós a surpresa e dar ao outro, serve para declararmos nossa
própria renúncia em nome do que será junto.
Paixão prostituta nunca entregará nada, nunca abrirá mão dos
próprios interesses, nunca reconhecerá sentimentos e nunca beijará o amor.
Não vivo mais nas esquinas da paixão, me recolhi para a casa
do amor.
W.O.
Muito belo! Quem é o autor para eu citá-lo(a)?
ResponderExcluirítalo bom dia, o Autor sou eu mesmo, escrevo crônicas já a algum tempo e fico feliz por ter gostado do que leu, estou sempre tentando atualizar o blog, pois tenho várias crônicas já escritas aguardando publicação.
ExcluirObrigado pelo comentário.